Uma das mais emblemáticas localidades fictícias da literatura moderna, Macondo ainda povoa a imaginação de quem leu a obra prima de Márquez, “Cem anos de solidão”. O que sabemos de Macondo é que ela é “uma aldeia de vinte casas de barro e taquara, construídas à margem de um rio de águas diáfanas que se precipitavam por um leito de pedras polidas, brancas e enormes como ovos pré-históricos", incrustada entre montanhas, um pântano, uma selva ao norte e próxima a uma costa marítima.
Assim, podemos perceber que qualquer lugar da América Latina poderia se encaixar na utópica cidade, facilitando a identificação com a narrativa. A história de Macondo se funde com a história da família Buendía, narrada em ‘Cem anos de solidão’, livro o qual rendeu o Prêmio Nobel da Literatura para Gabriel García Marquez em 1982.
Em seu discurso na entrega do prêmio, Gabo fala claramente de sua preocupação com a América Latina e o nomeia de “A solidão da América Latina”. Nele, cita problemas em diversos países, questões históricas ligadas à colonização, mas, acima de tudo, expressa sua fé numa “nova e arrasadora utopia de vida, onde ninguém possa decidir pelos outros até mesmo a forma de morrer, onde de verdade seja certo o amor e seja possível a felicidade, e onde as estirpes condenadas a cem anos de solidão tenham, enfim e para sempre, uma segunda oportunidade sobre a terra.”.
García Márquez também teve o seu “Dom Quixote”

A exemplo de Cervantes, Márquez também teve o seu “Dom Quixote” e as suas proezas surreais: promoveu trinta e duas rebeliões armadas, não ganhando nenhuma delas; teve dezessete filhos com dezessete mulheres diferentes; escapou de quatorze atentados, de setenta e três emboscadas e do pelotão de fuzilamento; sobreviveu a uma tentativa de suicídio. Foi liberal até o fim, lutando contra os conservadores.
Depois dessa odisseia amalucada, morreu na mais absoluta solidão, na velhice. Velhice que, para o Dom Quixote de García Márquez, nada mais era do “que um pacto honrado com a solidão”. Morrer só, “enfiando a cabeça entre os ombros, como um franguinho, e ficou imóvel com a testa apoiada no tronco da castanheira. A família não ficou sabendo até o dia seguinte, às onze da manhã, quando Santa Sofia de la Piedad foi jogar o lixo baldio dos fundos e reparou que os urubus estavam baixando”.
Este é o perfil do coronel Aureliano Buendía, um herói de causas perdidas, que tanto se assemelha com o espírito de nossa América Latina, tão cheia de revoluções, golpes e contragolpes sem sentido. Por meio do espírito quixotesco do coronel Aureliano Buendía, García Márquez revela nossa identidade, ao conectar o micromundo mágico das histórias contadas pelos seus avós com o terreno mais nobre que a literatura proporciona aos leitores: o deleite da realidade interior com a exterior. Ou seja, a conexão do espírito de nosso ser com a realidade política e econômica de um continente solitário.
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